Ponto & Vírgula: novembro 2018

Quando me perguntam o que é o pânico




Calma.

Já comecei este post três vezes e de nenhuma forma as frases me parecem bem. Já comecei a escrever este post três vezes e dessas três vezes pareceu-me nunca conseguir dizer realmente o que queria. 

Tenho a sensação de que aquilo que tenho para vos dizer hoje é importante mas eu não consigo que não pareça mais do mesmo e é aí que sei que me estou a trair e que hoje não é um dia bom - na certeza de não estar certa se as minhas palavras aumentam a luz em algum lugar. 

Eu duvidei tantas vezes da minha voz que parece quase ridículo hoje mostrar-vos que o estou a fazer novamente. - Mas isto de que eu vos falo todos os dias, o melhor que sei e consigo, é mesmo assim. Há dias em que não ter uma única certeza é o melhor desfecho que conseguimos. 

Queria dizer-vos hoje que as nossas jornadas não são assim tão diferentes e que eu não sou tudo isso que vocês acham. Eu não tenho coragem todos os dias, não tenho ânimo a cada minuto e há manhãs em que é muito difícil sair da cama. 
Queria mostrar-vos, se conseguisse, hoje, como o corpo me treme como se fosse colapsar, e como os meus olhos não têm expressão. Como, por breves momentos, vocês se assustariam com o meu choro compulsivo e a minha respiração desalinhada. Há cabelos e lágrimas e gestos repetitivos por toda a parte. Há um corpo pequeno contra o colchão e o contar das dores antigas, como se prostradas na minha frente, e eu as sofresse novamente como se fosse a primeira vez. 

O pânico é isso. Vocês perguntam-me muitas vezes como sei que é o pânico, novamente. Eu sei porque o pânico é isso: viver todas as dores de uma vida, simultaneamente, como se fosse a primeira vez e ela estendê-se até ao final. E nós fossemos com elas, sozinhas. 

Quando me perguntam o que é o pânico é isso que vos quero explicar que o pânico é: a sensação de urgência final e perigo iminente, como se não existisse outra saída que não doer assim. Como se mais ninguém e mais lugar nenhum no mundo fosse seguro o suficiente. 

Queria dizer-vos hoje que eu assumo-me frágil e insegura - sim. Não pensem um só segundo que repentinamente descobrimos como viver com as nossas partes difíceis e elas deixam de ser difíceis. -  Elas vão ser difíceis muitas vezes, mas não são sempre, e isso já é o suficiente. 
Queria dizer-vos que também eu vesti a confusão que me quiseram fazer e repeti muitas vezes para mim mesma que não tinha remédio, que tinha nascido com o cérebro ao contrário - que há dias, breves momentos em que ainda o repito e penso "outra vez. outra vez não.". 

Que não é o ginásio que me faz estar sempre feliz com a minha aparência ou me dá toda a certeza do mundo que sou invencível. Que também duvido do valor que tenho de semana a semana, ou muitas vezes na mesma semana. 
Não. 
Eu não tenho tudo compreendido e aprendido e sou feliz todos os dias. Mas se isso vos descansa, ninguém o tem e ninguém o é.

Porque nós somos um progresso e não um produto terminado a cada prova. 

E quando achamos que não vamos ser os mesmos depois de mais um dia igual, nós vamos ser muito melhores. 

Quando me perguntam o que é o pânico, o que é viver com o pânico, principalmente quando vocês me perguntam, eu quero dizer-vos que há dias em que me sinto tão detestável, tão pequena e desengonçada, tão triste e desnorteada que acho que afinal não tenho nada para vos contar. 
E depois encontro-me aqui, a falar com vocês novamente, e a respirar fundo a cada lágrima e depois as lágrimas vão ficando mais espaçadas até eu perceber que ainda não foi desta. 

Tinha a sensação que aquilo que tinha para vos dizer era importante, penso que talvez mais para mim do que para vocês e que vai ser estranho imaginarem-me de face vermelha e cabelos desalinhados quando muitas vezes me vêm de cara lavada. 

Mas, eu quero muito mais mostrar-vos essa face vermelha e os cabelos desalinhados que a cara lavada. Porque quero que seja finalmente compreendido que não existe nada de bonito nestes distúrbios. Nada de diferente, nada de apaixonante ou moderno. 

Não existe nada de bonito aqui a não ser a forma como vocês me fazem sentir melhor e eu sinto que faço alguma diferença para vocês. 


 Hoje queria dizer-vos que nossas jornadas não são assim tão diferentes. Que vai ser muito difícil para os outros que não a partilham compreenderem a forma como andamos uns quantos dias mais para o lado que para a frente, que podem existir dias a fio em que não nos sintamos apoiados. Compreendidos na urgência de ter um abraço que nos lembre que ainda somos matéria sólida. 
Mas que no final de tudo vamos descobrir que só nós, sozinhos, temos uma força inesgotável. E se conseguimos passar tantos dias assim, conseguimos passar quase tudo. 

Quando me perguntam o que é o pânico o que eu quero dizer é que tem sido a minha mais terrível maldição e a minha mais bem trabalhada benção. 




(deixo-vos um vídeo que gosto de ver quando me sinto sozinha. Nós somos muitos mais do que pensamos, cada um com as suas dores.)

E não se esqueçam nunca:
Caminhem com orgulho...sempre!

Inês.