Ponto & Vírgula: 2018

Q&A -Distúrbio de Pânico (como recuperei, como ajudar, o que pode desencadear...)


Olá gente corajosa.


 Hoje trago-vos o Q&A acerca do Distúrbio de Pânico respondendo a algumas questões que vocês me foram fazendo. Quero primeiramente dizer-vos que o blog tem estado mais sossegado porque quero que o conteúdo que vos faço chegar seja cuidado e fruto de algum trabalho. Esta semana, no entanto, vamos ter mais encontros marcados aqui. 

Por agora deixo-vos as minhas respostas sinceras ás questões que me fizeram, sem filtros, porque é assim que acredito que abordar estes assuntos tenha que ser. Precisamos de realidade, de saber que a vida do outro não é assim tão diferente e tão mais maravilhosa que a nossa e é isso que vos quero mostrar. 

Vamos?


*Disclaimer: as questões foram respondidas com base naquilo que foi a minha experiência. Não sou profissional da área e a vossa experiência pode não ser igual - o distúrbio de pânico, quase como todos os distúrbios psicológicos, é muito pessoal. Procurem sempre um profissional se acharem que precisam de ajuda real.



1 - O que podemos fazer quando uma pessoa ao nosso lado está a ter um ataque de pânico?

 É importante que tenhamos a noção que a forma de ajudar pode mudar consoante a pessoa. 
 O pânico não é uma experiência exactamente igual para todas as pessoas que sofrem dele, não tem as mesmas motivações e nem os mesmos mecanismos de exposição. Ainda assim, um bom princípio é não agarrar nem abafar a pessoa. Muitas vezes temos dificuldade em respirar, e quanto menos espaço aberto conseguirmos ver, mais vamos sentir dificuldade. 
Grande parte dos truques para acalmar passam por monitorizar a respiração, por isso, o princípio deve ser não enclausurar a pessoa. 

 Fiquem ao lado da pessoa e vão falando com ela. Quando os ataques de pânico surgem eles vêm acompanhados, muitas vezes, de pensamentos em cadeia, recorrentes e acelerados. Se alguém ao nosso lado for falando de outras coisas que não aquilo que pensamos isso pode ajudar que nos acabemos por distrair mais do que estamos a pensar, e acalmar a forma como pensamos acaba por ser uma grande ajuda para atravessar o ataque de pânico com menos violência. 
Podem também dizer coisas como "Está tudo bem", "Já passaste por isto, sabes que és forte e que vai passar", "Não te deixo sozinho""Vou ajudar-te a passar por isso". Se for alguém familiar ou namorado/a, podem também reforçar que amam a pessoa para além desta condição
que ela tem e assegurá-la que ela está em segurança e protegida.(para mim, esta última forma, é a que funciona melhor)

 Podem também perguntar à pessoa, se ela conseguir falar convosco, se ela quer sair do lugar onde está. - Por vezes locais muito fechados, com muito barulho, muitas pessoas ou muito escuros, podem despoletar ataques de pânico e manter a pessoa nesse local pode não ajudar à sua melhoria. 
 Perguntem também se ela quer andar um pouco; pessoalmente fico muito inquieta e ando muito á volta, levanto-me e sento-me e pareço não conseguir parar. Andar pode ajudar a gastar um pouco de energia e a fazer com que a pessoa se concentre numa outra coisa. 

Se souberem, podem fazer exercícios de respiração com a pessoa. Juntos ou ajudarem-na apenas a ela. Há aplicações que vos dão exemplos de como o podem fazer ou que têm até exercícios interactivos para o mesmo efeito. 

Por último e se a pessoa souber a causa, perguntem o que podem fazer para a ajudar. 

Acima de tudo saibam e compreendam que não depende estritamente de vocês que o ataque de pânico passe rápido ou não, mas se mantiverem a calma e apoiarem a pessoa podem estar a ajudar mais do que imaginam. Tudo aquilo que envolve os ataques de pânico não se resolve ali, durante o ataque, mas com tempo de terapia e compreensão da pessoa para com a pessoa.

Ainda assim tentem ser sempre o mais compreensivos e encorajadores possível. Muda muito a forma como nós nos sentimos e reagimos. 


2 - Que coisas banais podem causar pânico?

E se eu vos disser que a maior parte dos meus ataques de pânico são causados por questões banais?
(daí a dificuldade em pessoas exteriores compreenderem)
A questão principal aqui é que o meu cérebro entende situações banais como situações nas quais poderei estar sobre ameaça e por isso gera a reacção natural como se fosse uma ameaça real. 
E isto acaba por acontecer em ciclos. As situações podem nem ser parecidas, podem ser com pessoas diferentes, no entanto se por algum motivo aquilo que retiro delas for semelhante, o meu cérebro vai compreender como eu estando a passar outra vez por aquela situação que me marcou. 

Será por isso normal se as "red flags" dos ataques de pânico não sejam as mesmas para todas as pessoas que sofrem de Distúrbio de Pânico. 
O que posso dizer-vos é que coisas tão simples quanto locais, pessoas, conversas que temos, ideias nas quais insistimos, medos físicos irracionais, podem gerar ataques de pânico. 

Por tudo isto e por ser um ciclo como vos expliquei é que a terapia se torna ainda mais importante.

3 - O que te ajudou a passar isso?

Provavelmente o que mais me ajudou, a longo prazo, foi a terapia que fiz no psicólogo. Como expliquei na questão anterior, os ataques de pânico são despoletados muitas vezes por medos irracionais. Se conseguirmos perceber de onde vem esse medo conseguimos também aprender a desarmá-lo. Perceber de onde o medo vem, no entanto, só é possível, muitas vezes, com terapia. 
Para além disso a prática regular de exercício, a musculação como um objectivo e como um mecanismo de mudança pessoal, ajudou-me imenso a libertar energia e a construir uma auto-estima muito diferente e mais real. 
Perceber que eu era capaz de fazer coisas ali que achava não conseguir, que era capaz de mudar realmente e de criar hábitos diferentes, fez-me sentir que era capaz também de fazer muitas mais coisas que achava não ser capaz fora dali. 

Na verdade, o processo todo de passar a pior fase que vivi, foi feito de uma grande crença de que no dia seguinte me sentiria melhor, que estava sempre a tempo de me fazer diferente, de me criar mais forte e mais capaz. E eu acabei por crer nisso enquanto não acreditava nisso até acabar por começar a acreditar. 

4- Como trataste?

 A resposta a esta pergunta está presente na anterior, posso apenas acrescentar que durante 3, 4 dos 5 anos eu fiz medicação e a medicação acabou por não me ajudar de forma definitiva, acabando por me fazer piorar. Dessa situação nasceu então a necessidade de encontrar outra forma de lidar e a terapia foi a que me fez melhor. 

5- Como explicar a amigos e familiares que não compreendem ?

Esta é talvez a pergunta mais difícil que vocês me fizeram. É difícil porque eu ainda não encontrei uma resposta que vos possa ajudar tanto quanto gostaria. 
O problema com estas doenças é que elas são doenças funcionais - nós conseguimos fazer tudo o que as pessoas que não vivem com elas fazem sem demonstrar o quanto mais custa pois os sintomas não são propriamente visíveis. Os sintomas, esses, que por vezes até se podem ver, também não têm meio de comparação possível para pessoas que nunca passaram por eles. 
A única coisa, talvez, que eu vos posso dizer que vá fazer alguma diferença é expressarem-se nesse sentido, explicarem como se sentem e terem a noção de que seja a resposta positiva ou negativa, nada disso invalida a doença que vocês têm. Nada disso invalida que vocês não estejam a tentar o mais possível e a esforçarem-se por ser melhor todos os dias. 
Tentem falar com um profissional, para além de muitas outras coisas, ele vai ajudar-vos a lidar com isso. 

Nós não podemos obrigar as pessoas que nos rodeiam a compreender-nos. Quando são familiares ou amigos, no entanto, eles devem-nos essa compreensão, pois supostamente amam-nos. Tentem explicar-lhes que só precisam do apoio deles, desse apoio que vos prometeram. 
Mas nunca dependam disso para a vossa recuperação.- e isto também é uma coisa que se aprende.(com o seu tempo devido)

6 - Como encontras motivação para lutares contra isso?

 Faço a mesma pergunta a mim mesma todos os dias. Acho que tudo partiu desde o dia em que eu decidi que não queria mais viver assim. - E a motivação nunca foi exterior. Nunca foi porque achei que tinha que me tornar mais confortável para os outros. Eu queria tornar a minha vida mais confortável e feliz para mim. 
Eu senti muitas vezes que estava a perder momentos e anos valiosos para mim, experiências que eu não vivia realmente porque aquele elefante na sala não me deixava. 

Acima de tudo acredito que (e eu já disse isto antes) quando chegamos ao fundo do poço só podemos voltar para cima e acho que foi chegar aí que me fez mudar a perspectiva sobre como via a vida e como lidava com ela. Senti uma enorme urgência em agarrar-me àquilo que sentia que me estava a fugir.

Não foi fácil, nada fácil, nem bonito. Continuam a existir dias nada fáceis nem nada bonitos, daí por vezes desaparecer das redes sociais, mas no fundo eu aprendi o que devia fazer e o que me faria melhor nesses dias e não há nada que neste momento se sobreponha a isso. Nós precisamos de cuidar da nossa saúde mental como cuidamos da nossa pele e do nosso corpo e nos dias em que estou pior essa é a minha prioridade. 

A minha motivação, no entanto, a minha motivação objectiva, real e palpável sou eu. - Não quero parecer presunçosa, mas nós devíamos poder dizer isto. Todos os dias e todas as vezes necessárias. Devíamos poder sentir-nos orgulhosos e felizes por nós mesmos sem vergonha ou medo do que vão dizer. Devíamos poder dizer que somos a nossa maior motivação e o nosso mais amado projecto, porque o devíamos ser, sempre. 
Só nós vamos ter que viver connosco para o resto da vida e isso devia ser razão suficiente para sermos o nosso lugar seguro. 

Então sim, neste momento eu assumo ser a minha maior motivação. Assumo lembrar-me muitas vezes do que fiz até chegar aqui e do quanto sofri para chegar assim. Mesmo assim não desistindo. 
A felicidade que sinto hoje fui eu que a criei para mim - não me foi oferecida facilmente. E se eu criei isto, então eu acredito que consiga criar muito mais. 

Nós não conhecemos o nosso poder até que acreditamos que ele existe e o tentamos encontrar. Ou criar. - e é por aqui que devemos começar a jornada, por saber que somos capazes. Mesmo que não acreditemos logo. 



 Espero que tenham gostado e se tiverem mais questões, deixem-nas aqui ou lá no instagram que assim que conseguir eu vou responder-vos! E fiquem por cá que esta semana vai ser agitada!

E não se esqueçam nunca:
Caminhem com orgulho...sempre!

Inês. 



Quando me perguntam o que é o pânico




Calma.

Já comecei este post três vezes e de nenhuma forma as frases me parecem bem. Já comecei a escrever este post três vezes e dessas três vezes pareceu-me nunca conseguir dizer realmente o que queria. 

Tenho a sensação de que aquilo que tenho para vos dizer hoje é importante mas eu não consigo que não pareça mais do mesmo e é aí que sei que me estou a trair e que hoje não é um dia bom - na certeza de não estar certa se as minhas palavras aumentam a luz em algum lugar. 

Eu duvidei tantas vezes da minha voz que parece quase ridículo hoje mostrar-vos que o estou a fazer novamente. - Mas isto de que eu vos falo todos os dias, o melhor que sei e consigo, é mesmo assim. Há dias em que não ter uma única certeza é o melhor desfecho que conseguimos. 

Queria dizer-vos hoje que as nossas jornadas não são assim tão diferentes e que eu não sou tudo isso que vocês acham. Eu não tenho coragem todos os dias, não tenho ânimo a cada minuto e há manhãs em que é muito difícil sair da cama. 
Queria mostrar-vos, se conseguisse, hoje, como o corpo me treme como se fosse colapsar, e como os meus olhos não têm expressão. Como, por breves momentos, vocês se assustariam com o meu choro compulsivo e a minha respiração desalinhada. Há cabelos e lágrimas e gestos repetitivos por toda a parte. Há um corpo pequeno contra o colchão e o contar das dores antigas, como se prostradas na minha frente, e eu as sofresse novamente como se fosse a primeira vez. 

O pânico é isso. Vocês perguntam-me muitas vezes como sei que é o pânico, novamente. Eu sei porque o pânico é isso: viver todas as dores de uma vida, simultaneamente, como se fosse a primeira vez e ela estendê-se até ao final. E nós fossemos com elas, sozinhas. 

Quando me perguntam o que é o pânico é isso que vos quero explicar que o pânico é: a sensação de urgência final e perigo iminente, como se não existisse outra saída que não doer assim. Como se mais ninguém e mais lugar nenhum no mundo fosse seguro o suficiente. 

Queria dizer-vos hoje que eu assumo-me frágil e insegura - sim. Não pensem um só segundo que repentinamente descobrimos como viver com as nossas partes difíceis e elas deixam de ser difíceis. -  Elas vão ser difíceis muitas vezes, mas não são sempre, e isso já é o suficiente. 
Queria dizer-vos que também eu vesti a confusão que me quiseram fazer e repeti muitas vezes para mim mesma que não tinha remédio, que tinha nascido com o cérebro ao contrário - que há dias, breves momentos em que ainda o repito e penso "outra vez. outra vez não.". 

Que não é o ginásio que me faz estar sempre feliz com a minha aparência ou me dá toda a certeza do mundo que sou invencível. Que também duvido do valor que tenho de semana a semana, ou muitas vezes na mesma semana. 
Não. 
Eu não tenho tudo compreendido e aprendido e sou feliz todos os dias. Mas se isso vos descansa, ninguém o tem e ninguém o é.

Porque nós somos um progresso e não um produto terminado a cada prova. 

E quando achamos que não vamos ser os mesmos depois de mais um dia igual, nós vamos ser muito melhores. 

Quando me perguntam o que é o pânico, o que é viver com o pânico, principalmente quando vocês me perguntam, eu quero dizer-vos que há dias em que me sinto tão detestável, tão pequena e desengonçada, tão triste e desnorteada que acho que afinal não tenho nada para vos contar. 
E depois encontro-me aqui, a falar com vocês novamente, e a respirar fundo a cada lágrima e depois as lágrimas vão ficando mais espaçadas até eu perceber que ainda não foi desta. 

Tinha a sensação que aquilo que tinha para vos dizer era importante, penso que talvez mais para mim do que para vocês e que vai ser estranho imaginarem-me de face vermelha e cabelos desalinhados quando muitas vezes me vêm de cara lavada. 

Mas, eu quero muito mais mostrar-vos essa face vermelha e os cabelos desalinhados que a cara lavada. Porque quero que seja finalmente compreendido que não existe nada de bonito nestes distúrbios. Nada de diferente, nada de apaixonante ou moderno. 

Não existe nada de bonito aqui a não ser a forma como vocês me fazem sentir melhor e eu sinto que faço alguma diferença para vocês. 


 Hoje queria dizer-vos que nossas jornadas não são assim tão diferentes. Que vai ser muito difícil para os outros que não a partilham compreenderem a forma como andamos uns quantos dias mais para o lado que para a frente, que podem existir dias a fio em que não nos sintamos apoiados. Compreendidos na urgência de ter um abraço que nos lembre que ainda somos matéria sólida. 
Mas que no final de tudo vamos descobrir que só nós, sozinhos, temos uma força inesgotável. E se conseguimos passar tantos dias assim, conseguimos passar quase tudo. 

Quando me perguntam o que é o pânico o que eu quero dizer é que tem sido a minha mais terrível maldição e a minha mais bem trabalhada benção. 




(deixo-vos um vídeo que gosto de ver quando me sinto sozinha. Nós somos muitos mais do que pensamos, cada um com as suas dores.)

E não se esqueçam nunca:
Caminhem com orgulho...sempre!

Inês. 





Sejam Bem-Vindos!




                                                                                       Coragem.


Agora...eu sei que isto é que é realmente uma surpresa. Até para mim, é uma surpresa - Vocês não sabem as voltas que foram dadas no in the making do vídeo e se vissem seria um vídeo de comédia...- mas quero crer que é uma surpresa boa. 
Em parte deve-se principalmente a vocês que me encheram de coragem para seguir com aquilo que aqui vos apresento e que já perceberam o que é. 
Mas as surpresas não terminam por aqui...O Ponto e Vírgula ainda vos vai trazer mais alguns miminhos que espero que apreciem tanto quanto eu aprecio, e teria apreciado na altura em que precisei deles. 

Se há algo que este ano me mostrou é que atrás de rostos aparentemente serenos e felizes, somos muitos mais do que imaginamos juntos na mesma jornada. A querer falar do mesmo. A não saber por onde começar porque a temática parece ter que ser cunhada de um peso que não precisa, realmente, de ter. 

Aqui a conversa será leve. Acredito que a mudança comece nas nossas atitudes. 

Vocês têm ajudado a mudar muitas das minhas, a querer falar mais abertamente, a dar valor àquilo que tenho para dizer. Pela primeira vez. 

As nossas histórias são quem somos mas são também, muitas vezes, o ponto de encontro do que os outros são. Não há maior beleza que essa - e não há maior felicidade que poder testemunhar as vossas histórias. 

Espero que me acompanhem e me deixem fazer-vos parte deste caminho. Sintam-se confortáveis para opinar ou saltem até ao Instagram onde já está aberto o espaço a perguntas. 


E não se esqueçam nunca:
Caminhem com orgulho...sempre!

Inês. 





Ps - lamento pela qualidade do vídeo, foi apenas um miminho para ser mais perto de vós e não está previsto ser regular. E lamento pelo nervoso também mas para isso não há remédio.